- Introdução
A Norma Regulamentadora 1 (NR-1), “Disposições Gerais e Gerenciamento de Riscos Ocupacionais”, constitui a base de todo o sistema de saúde e segurança do trabalho no Brasil, estabelecendo princípios, definições e responsabilidades mínimas tanto para empregadores quanto para trabalhadores. Em 25 de maio de 2025, entrou em vigor a atualização que, pela primeira vez, incorpora expressamente a gestão de riscos psicossociais ao Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), conferindo maior amplitude ao conceito de ambiente saudável.
O objetivo deste artigo é examinar em detalhes as novidades trazidas pela revisão da NR-1 e demonstrar como a cultura de ética organizacional aumenta a prevenção de agravos à saúde mental, transformando o cumprimento normativo em oportunidade de valorizar o capital humano.
2.Panorama da NR-1 antes de maio/2025
2.1 Escopo
a. A NR-1 aplica-se a todas as empresas com empregados regidos pela CLT, definindo regras gerais e indicando que cada Norma Regulamentadora subsequente detalhará requisitos específicos.
2.2 Princípios básicos
a. Gerenciamento de Riscos Ocupacionais (GRO): implementação de processo contínuo de identificação, avaliação, controle e monitoramento de riscos físicos, químicos, biológicos e ambientais.
b. Responsabilidade Compartilhada: equilíbrio entre as obrigações do empregador (prover condições seguras) e do empregado (cumprir as medidas preventivas).
2.3 Limitações anteriores
a. Enquanto as normas vizinhas abordavam ergonomia (NR-17), agentes ambientais (NR-9) e outros temas, a dimensão psicossocial não figurava como risco formal, ficando sua gestão dispersa em outras iniciativas voluntárias ou setoriais.
3. Novidades da atualização de maio de 2025
3.1 Gestão de riscos psicossociais no PGR
a. Inclusão obrigatória: a partir de 25/05/2025, todo PGR deve mapear fatores como carga excessiva de trabalho, prazos inatingíveis, assédio moral e quebra de autonomia.
b. Metodologia estruturada: recomenda-se aplicar etapas de identificação (pesquisas de clima, entrevistas), avaliação qualitativa e quantitativa (índices de faltas, atrasos e rotatividade) e ações mitigadoras (restruturação de processos, pausas programadas).
3.2 Treinamentos específicos
a. Destinados a gestores e equipes de segurança do trabalho, com foco em sinais precoces de sofrimento psíquico e técnicas de escuta ativa.
b. Carga mínima: 8 horas/ano por gestor, subdivididas em módulos sobre comunicação não violenta, práticas de acolhimento e legislação de saúde mental.
3.3 Monitoramento contínuo
a. Implantação de indicadores de bem-estar, como pesquisas semestrais de satisfação e canais confidenciais de denúncia.
b. Responsabilidade do CIPA e dos Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT) de elaborar relatórios semestrais e propor melhorias.
3.4 Integração normativa e internacional
a. NR-9 (Riscos Ambientais) e NR-17 (Ergonomia): reforço na visão sistêmica, alertando para a interação entre fatores físicos e psicossociais.
b. ISO 45003: recomendação de alinhamento com diretrizes internacionais de gestão de riscos psicossociais, garantindo boas práticas e maior reconhecimento global.
3.5 Prazo de implementação
a. Período de transição: 12 meses, contados de 25 de maio de 2025 a 25 de maio de 2026, com relatórios de progresso a cada seis meses.
- 4. Impactos práticos para empresas e trabalhadores
- 4.1Custos x benefícios
- a. Investimento inicial: revisão do PGR, contratação de consultorias e horas-técnicas para treinamentos.
- b. Retorno sobre investimento (ROI): redução de afastamentos, diminuição da rotatividade de pessoas e ganhos de produtividade; estudos setoriais indicam até 20 % de melhoria no engajamento de equipes que adotam boas práticas de saúde mental.
- 4.2 Cultura organizacional e políticas internas
- a. Revisão de códigos de conduta para explicitar o combate ao assédio moral e promover a equidade.
- b. Fortalecimento de Programas de Assistência ao Empregado (PAE) com suporte psicológico e jurídico.
- 4.3 Fluxo sugerido para atualização do PGR
- a. Diagnóstico preliminar: levantamento documental e reuniões de workshop.
- b. Mapeamento de riscos psicossociais: aplicação de questionários validados e grupos de foco.
- c. Plano de ação: definição de responsáveis, prazos e indicadores.
- d. Treinamento e comunicação: calendário de capacitações e campanhas internas.
- e. Avaliação e ajuste: medições semestrais e realinhamento de ações conforme resultados.
- 5. Ética no ambiente de trabalho e saúde mental
- 5.1 Ética organizacional
- a. Conjunto de valores e normas que orientam comportamentos justos e transparentes no dia a dia laboral.
- b. Modelos de governança baseados em respeito mútuo, igualdade de oportunidades e responsabilidade social.
- 5.2 Relação com riscos psicossociais
- a. Práticas antiéticas, como favorecimento indevido, pressão por resultados sem base em critérios objetivos ou falta de transparência, geram clima de desconfiança, aumentando o estresse e a sensação de injustiça.
- b. Adoção de política de “canal aberto” e canal interno de ouvidoria reforça a percepção de segurança psicológica, permitindo que colaboradores indiquem condutas impróprias sem medo de retaliação.
- 5.3 Precedentes e tendências jurisprudenciais
- a. É crescente o entendimento do TST de que cabe ao empregador o “dever de cuidar” não só da integridade física, mas também da saúde psíquica, sob pena de responsabilização por dano moral coletivo.
- b. Recentes decisões têm reconhecido assédio moral organizacional quando há adoção de metas abusivas ou comunicação fortemente punitiva.
- 5.4 Boas práticas éticas
- a. Elaboração e divulgação de Código de Ética claro, com exemplos concretos de condutas esperadas.
- b. Programas regulares de compliance e treinamentos sobre ética para todas as lideranças.
- c. Avaliação 360° de gestores, considerando feedbacks de subordinados.
- Conclusão e Recomendações Práticas
A atualização da NR-1, ao incorporar os riscos psicossociais, representa um salto qualitativo na proteção da saúde do trabalhador e na sustentabilidade das organizações. Entretanto, a mera adequação técnica é insuficiente se não caminhar lado a lado com uma cultura ética que valorize o respeito, a transparência e o cuidado mútuo.
Checklist para início imediato
- Revisar o texto do PGR, incluindo riscos psicossociais.
- Planejar treinamentos de 8 horas/ano para gestores sobre saúde mental e comunicação não violenta.
- Implantar pesquisas semestrais de clima organizacional e canais confidenciais de denúncia.
- Atualizar Código de Ética e políticas de combate ao assédio moral.
- Alinhar práticas ao ISO 45003 e integrar PGR com NRs 9 e 17.
- Definir cronograma de relatórios semestrais de avanço, dentro do prazo de 12 meses (até 25/05/2026).
Ao adotar essas medidas, a empresa não só cumpre a norma, como fortalece seu diferencial competitivo, atrai talentos e reduz passivos trabalhistas. Mais do que uma obrigação legal, a gestão ética e responsável dos riscos psicossociais é um investimento no bem-estar e na longevidade do negócio.
